A mulher independente nunca ousou pedir ajuda para fechar seu colar de pérolas.Afinal aprendeu sozinha a amarrar os sapatos com 4 anos e com 5 já demonstrava seu interesse pelos livros.Aos 7 descobriu o sonho curioso e a vontade avassaladora de sair das piscinas de bolinha dos drive thru que seu pai costumava levar,e se aventurar numa piscina de verdade,de cabeça.Aos 10 se embonecava sozinha para dançar o ballet que à fazia sentir como uma princesa,aquela saia rodada e os coques no cabelo à faziam se sentir linda.Aos 13 esnobava os garotos que faziam a corte,achava um insulto aquela pataquada e gritaria toda só por conta de uma bola.A simples gentileza no pedido de "carregar" suas coisas até em casa era uma afronta a sua independência.Aos 16 começou a desbravar mundos novos,sair a noite,seu primeiro drink com alcool escondido dos pais,o primeiro beijo,a primeira briga com a melhor amiga,a primeira espinha que atreveu-se em aparecer justo na hora da festa e ela quis se matar.
Aos 21 morava sozinha,lavava suas roupas sozinha,lavava a pilha de louça que tinha encima da pia a dias sozinha,saia para a balada e detonava drinks com alcool a noite inteira só para conseguir cair na cama direto,e não importava a ressaca do dia seguinte.Nas madrugadas da vida,entre um texto e outro que escrevia para o trabalho,olhava para o lado vazio da cama e se sentia vazia.Pensava em querer compania,pensava que precisava de compania,pensava em ligar para a "compania",mais logo voltava a escrever,afinal tinha um prazo para entregar seus textos pela manhã,não podia se dar ao luxo.
Aos 25 já namorando a 3 foi pedida em casamento.Seu lado mulherzinha ao olhar aquele brilhante sentiu-se a mais bela criatura do universo,um brilhante seguido de uma declaração de amor é de deixar qualquer mulher se sentindo uma rainha,ainda que rainha só do coração daquele homem.Ela pode perceber que virou outra e que precisava de mais que um lugar vazio na mesa.Estava na sua frente a vida que agora ela teria.Casa,comida e o aconchego daqueles braços e pernas embaixo do edredom a noite inteira.Suas noites nao seriam mais tão frias.Ela finalmente iria conseguir comer aquele vidro de palmito que não conseguia abrir e passava a noite com vontade."Jás ali" quem iria abrir os vidros,esquentar as noites e fazer com que ela pudesse se sentir a princesinha do ballet por tempo integral.
Aos 29 casada a 3 já sentia saudade do "sofrimentozinho" para abrir o vidro,sentia falta das noites frias e já estava de saco cheio de se sentir uma princesa.Até que um belo dia,decidiu partir,pois já não podia mais suportar tanta atenção e "pés" durante a noite.Fez as malas,comprou as passagens,foi embora para uma viajem sozinha,para um lugar onde sempre teve vontade de ir.Lá abriu alguns vidros,outros não porque não teve força.Sentiu frio,dormiu com o aquecedor e ainda assim,sentiu seus dedinhos congelando.Sentiu vontade de gritar,uivar de ódio quando aquela barata entrou no quarto e ela não teve coragem de matar,passou a noite inteira na sala.Gastou um frasco de veneno e a barata deve esta lá até hoje.
Um belo dia a mulher independente percebeu que precisava de alguém para abrir os vidros,trocar a lampada,desentupir a pia,instalar o chuveiro,aquecer os pés.A mulher independente finalmente conseguiu aceitar que não é porque ela já sabia amarrar sapatos aos 4 e ler aos 5 que ela era alto-suficiente em tudo e nao precisava de uma ajudinha as vezes.A mulher independente soube aceitar que a simples gentileza de "carregar" suas coisas até em casa não era uma afronta a sua independência.A independente aceitou que pode sim desbravar novos mundos e drinks,com muito alcool e acompanhada.Ela finalmente soube entender que sozinho não é impossível,mas é mais complicado.E que junto,junto ficava bem mais quentinho comer os palmitos daquele maldito vidro que ela não abria nunca.
Mas a mulher independente jamais ousou pedir ajuda para fechar seu colar de pérolas.Porque achava ridículo pedir ajuda para uma coisa que ela conseguia fazer sozinha.
"Que a minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que mereço/
Que a tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada /
Porque metade de mim é o que penso /
A outra metade é um vulcão."
(O.Montenegro)
Que a tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada /
Porque metade de mim é o que penso /
A outra metade é um vulcão."
(O.Montenegro)
2 Atrevidos:
apesar de 'sozinha' eu queria muito ser uma mulher independente, pelo menos as vezes.
beijo
Dependendo do ponto de vista todos nós somos dependentes, seja para o que for.
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